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Ter, 22 de Setembro 2015 - 14:45
Professores, estudantes e a direção da E.E. Aggêo Pereira do Amaral, que fica na cidade de Sorocaba, interior de São Paulo, estão sendo ameaçados pela Polícia Militar por conta de um trabalho desenvolvido junto aos alunos, sobre o tema da violência policial.
A absurda postura da PM em incidir no trabalho pedagógico de uma Escola Pública e intimidar profissionais de Educação, por entenderem que o conteúdo trabalhado está “longe de ser uma metodologia aceitável”, demonstra o quanto vivemos em uma falsa democracia. Há algum tempo publiquei aqui um texto sobre a expansão dos colégios militares por todo o país. Há uma militarização que ultrapassa a cotidiana postura violenta e letal das polícias. Há também uma crescente militarização das ideias, dos valores, da educação e da política.
A Comissão de Direitos Humanos da OAB de Sorocaba está acompanhando e mobilizando atores sociais em defesa da escola, professores e estudantes, da liberdade de cátedra, da liberdade de expressão e para enfrentamento a mais essa demonstração de autoritarismo da polícia e do governo do Estado de São Paulo, conforme relata o advogado Hugo Batalha, no texto abaixo.
Hugo Batalha - advogado
Em Sorocaba a Comissão de Direitos Humanos da OAB juntamente com outras entidades está enfrentando uma situação típica de um regime ditatorial. Na Escola Estadual Aggeo a PM está intimidando a comunidade escolar numa tentativa de censurar os trabalhos escolares baseados na obra “Vigiar e Punir” de Michel Foucault, material que integra o currículo escolar do ensino médio e constitui leitura obrigatória para estudo da filosofia.
Ao tomar conhecimento dos trabalhos, uma tenente e dois cabos foram até a escola para intimidar o corpo docente, entretanto, diante da firmeza da direção e dos professores, várias viaturas da ROTA passaram a rondar a escola com objetivo de amedrontar e ameaçar a comunidade escolar. Sim, a ROTA, que é considerada o grupo de elite da corporação, passou a fazer patrulha escolar.
Não satisfeita, a PM divulgou uma nota oficial em sua página, expondo o nome de um dos professores da escola,e exigiu que a Diretoria de Ensino tome providências para censurar e repreender o professor e os alunos. Isso mesmo: a PM está tentando interferir no conteúdo do currículo escolar. Tudo por conta de um trabalho sobre obra “Vigiar e punir” de Michel Foucault.
"Não queremos acreditar que em pleno século XXI, profissionais da área de ensino posicionem-se de maneira discriminatória, propagando e incutindo o discurso de ódio em desfavor de profissionais da segurança, estimulando seus alunos a agirem sem embasamento e direcionando-os de acordo com ideologias anacrônicas, que em nada contribuem para a melhoria da sociedade. A PM sempre foi e será grande defensora dos direitos humanos e dos deveres morais, éticos e legais da sociedade".
No trabalho foi usada uma charge do cartunista Latuff que retrata a face da polícia militar (Rota) com o rosto de uma caveira, a mesma caveira que a própria polícia adota como símbolo e se orgulha de reafirmar sempre. Toda a comunidade escolar está sendo duramente atacada. A nota da PM provocou uma reação descontrolada. Professores, direção e alunos estão sendo alvo de ataques, ameaças e ofensas.
A Comissão de Direitos da OAB Sorocaba está articulando uma rede de apoio para defender a liberdade dos estudantes, a liberdade de cátedra, a integridade da comunidade escolar e repudiar a ação ilegal da PM que ultrapassa em muito a esfera de suas atribuições e constitui crime de abuso de autoridade, constrangimento ilegal e censura que é inadmissível num estado democrático de direito.
A polícia ou qualquer outra instituição não pode interferir no currículo e no conteúdo pedagógico de uma escola. Essa discussão cabe exclusivamente aos órgãos de educação. Não é atribuição da polícia realizar monitoramento e patrulhamento de conteúdo acadêmico! Essa situação é a prova mais concreta de que a PM precisa se adequar ao modelo constitucional inaugurado em 1988.
A estrutura a polícia militar, que oprime o próprio policial que é destituído de todos seus direitos, aprofunda um processo de criminalização secundária e seletividade penal orientada por critérios de vulnerabilidade social e econômica. A ousadia da PM de acreditar que tem legitimidade para censurar um professor e seus alunos remonta os tempos do regime militar! Pedimos o apoio de organizações sociais com notas públicas repudiando a ação da PM e defendendo a liberdade da comunidade escolar.
Lançamos também a campanha:
#somostodosaggeo
Por: Douglas Belchior - Carta Capital – 22/09