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Qui, 16 de Abril 2015 - 17:06
Socos nas costas, agressão com pedaço de pau e ameaça de tiro na cara de professores. Esses absurdos fazem parte do barril de pólvora no qual se transformou parte das salas de aula em escolas estaduais de Ribeirão Preto.
Agressões e humilhações sofridas na sala de aula têm levado professores aos consultórios e provocado afastamentos por transtornos mentais. Nos últimos dois meses, cinco ocorrências do tipo foram registradas pela Apeoesp em escolas da cidade.
“O número de denúncias vem crescendo, mesmo com o fato de muitos professores não denunciarem por medo de represálias da direção da escola”, diz Mauro Inácio, coordenador regional da Apeoesp.
No caso mais recente, uma aluna de 16 anos atirou um caderno na cara de uma professora da escola Dom Alberto José Gonçalves, nos Campos Elíseos, e depois, a golpeou com socos nas costas. No dia seguinte, a professora ainda ouviu de um aluno: “voltou para apanhar mais”.
A agressão ocorreu no último dia 31 e, no dia 9, a professora acabou afastada da escola com depressão e síndrome do pânico. “Não tenho coragem de voltar para a sala de aula. Em 23 anos, nunca havia passado por isso”.
Um colega da professora considera a suspensão da aluna uma premiação. “O castigo deve ter sido até bom porque a aluna ficou descansando em casa”.
Segundo ele, a estudante deveria pedir desculpas para a professora e prestar algum serviço para a escola para refletir sobre o que fez.
Tiro na cara
Na escola Cid de Oliveira Leite, no Jardim Paulista, a professora Márcia (nome fictício) foi outra vítima.
Após um aluno ser repreendido para fazer silêncio, ele pediu para sair da sala. A docente quis saber o porquê. A resposta: “não aguento olhar para sua cara”. “Depois disso ele disse que iria me dar um tiro na cara e que não tinha medo da polícia”. O caso ocorreu em março do ano passado.
Em outra ocorrência, em março de 2013, o professor Paulo (nome fictício), da escola Romualdo Monteiro, foi agredido por um aluno dentro da sala de aula com um pedaço de pau. O docente precisou ser transferido de unidade porque não tinha mais condições psicológicas de lecionar naquela escola.
Docente perde autoridade
O coordenador do Observatório de Violência da USP, Sérgio Kodato, considera que os casos de agressão física contra professores vêm aumentando por conta da perda de autoridade do professor dentro da sala de aula.
“A introdução da progressão continuada obriga os professores a passarem todos os alunos de ano, é um sistema totalmente permissivo. Antes, o professor tinha um grande mecanismo de controle, que era a reprovação. Hoje o aluno vai para a diretoria em um dia e no outro volta dando risada da cara do docente”.
Ele considera que a direção e todos os professores teriam de ser treinados para resolver a violência dentro da sala de aula – e os pais deveriam ser incluídos nesse treinamento.
“A figura do professor mediador é insuficiente e somente dá resposta paliativa para graves problemas. Na Europa, por exemplo, os próprios alunos são treinados em mediação e redução e conflitos”, concluiu.
Mediador vai acompanhar ocorrência
A Escola Estadual Dom Alberto José Gonçalves conta com a atuação de um professor-mediador, profissional presente na rede estadual de ensino capacitado para identificar vulnerabilidades e traçar estratégias preventivas aos conflitos. Ele acompanhará a estudante e a docente.
“Casos como o na escola estadual Dom Alberto José Gonçalves devem ser acompanhados por várias frentes, incluindo escola e responsáveis. Os pais da estudante foram acionados pela direção da unidade que, junto ao Conselho Escolar, determinou a punição à aluna”, informa nota da Secretaria de Estado da Educação. O tipo de punição, no entanto, não foi esclarecido.
A Diretoria de Ensino permanece à disposição da professora e orienta as escolas e professores que passam por situações de conflito que os responsáveis devem ser convocados e, sempre que necessário, sejam registrados boletins de ocorrência.
“A Diretoria de Ensino repudia qualquer ato de violência, seja entre alunos ou quando as vítimas são professores, figuras essenciais no processo de ensino-aprendizagem e que deveriam e merecem contar com o respeito de seus alunos”.
Permanecer é um ato de bravura
Hoje é um ato de bravura permanecer como professor. Como consequência desta triste realidade, vemos profissionais mudando de área e mesmo os mais jovens desistindo da carreira. As consequências da violência na escola são episódios de depressão, síndrome do pânico e doenças psicossomáticas somadas ao estresse. Pela situação de trabalho em que vivem os professores, é notório que a prática não é por uma questão de salário e sim de vocação, um ato de total doação. Episódios de violência revelam que faltam total reconhecimento e o básico – o respeito com aquele incumbido de corrigir os que tanto precisam de educação no sentido amplo da palavra. Há, porém, exceções que ainda fazem com que esses profissionais busquem motivação e continuem lutando. Mas, infelizmente, a falta de limite é percebida hoje em todas as esferas e idades.
Rubyana Rodrigues
Psicóloga