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Qua, 01 de Novembro 2017 - 20:20
Violência na escola
Os casos extremos ganham manchetes. Há, porém, crimes silenciosos, que raramente têm visibilidade e se perpetuam sem que se tente impedi-los
*Jorge Werthein
Onde estão os responsáveis por alunos tão jovens, antes, durante e depois de passarem por vivências traumatizantes? O que fizeram para prevenir, enfrentar ou solucionar o problema? Elegem corretamente suas prioridades na educação? Enxergam e conhecem os alunos que passam no mínimo quatro horas por dia na escola? Sabem quem está perto deles enquanto estudam, lancham, conversam?
Quem vai conhecer a realidade das escolas brasileiras ouve relatos tão assustadores quanto revoltantes. Crianças e adolescentes revelam experiências de assédio moral e sexual, agressão verbal e física, dramas psicológicos variados. Mas a frequência e a reincidência dessas práticas causam mais que assombro e indignação. Por quê?
É inegável a relevância de fatores como número de matrícula, taxa de permanência e desempenho escolar, indicadores de qualidade. Esses dados estão diretamente relacionados com o ambiente físico e psicológico em que meninas e meninos adquirem conhecimentos que farão diferença pelo resto da vida.
Quando um vigia provoca um incêndio que leva à morte crianças e a si próprio dentro de uma escola, o episódio gera comoção nacional. Mas corre o risco ser esquecido. Os casos extremos ganham manchetes. Há, porém, os crimes silenciosos, que raramente têm visibilidade e se perpetuam sem que se tente impedi-los.
Ninguém lê nas escolas os sinais que normalmente antecedem as diferentes formas de violência de que são alvos tantos estudantes? Como se sabe, a educação extrapola a família e envolve uma rede que vai dos gabinetes às salas de aula, passando por pátios, cantinas, quadras, entorno escolar. Todos têm sua parcela de responsabilidade pela saúde física e mental dos estudantes.
Cabe lembrar que a violência não se restringe às instituições públicas de ensino. Inclui as particulares. Naturalmente, a falta de recursos das famílias de baixa renda agrava o quadro, pois elas geralmente não têm como apelar para trocas de sala, de escola ou de professores ou mesmo para contratar psicólogos, advogados e outros profissionais necessários para garantir o bem-estar da criança em situação de agravo.
Tudo isso é mais preocupante quando se observa uma espécie de complexo de avestruz, pelo qual não enxergar a gravidade da situação é a única resposta ao drama que afeta estudantes, professor e o próprio sistema escolar.
Chama a atenção que o Brasil, com uma das taxas mais altas de violência do mundo, despreze a necessidade de se pesquisar por que esses níveis inaceitáveis de outras formas de violência atingem as escolas. É de pequenos cidadãos que estamos tratando. Merecem políticas públicas que tornem visível o problema para enfrentá-lo imediatamente.
* É sociólogo; foi representante da Unesco no Brasil e nos Estados Unidos