FILIADO À
E
FILIADO À
E
Qua, 19 de Agosto 2015 - 16:27
Por: Ana Maria Lopes - APEOESP - 19/08/2015
O título da tese de doutorado da professora Sueli de Lima Moreira - "O sentido da aprendizagem escolar para jovens de meios populares" - levanta uma questão rotineira para os que vivem o cotidiano da escola pública. Os projetos pedagógicos ainda estão distantes da realidade dos estudantes, que são muito pouco ouvidos no ambiente escolar.
Sob a coordenação da professora Maria Isabel de Almeida, da Faculdade de Educação da USP, a pesquisadora dedicou-se ao tema durante quatro anos, partindo do princípio de que "a educação, como nos ensinou Paulo Freire, é um lugar de conflito, onde o diálogo precisa ser conquistado, principalmente entre as experiências populares, geralmente expressas nas vozes de estudantes, e o saber escolar, expressos nos currículos e nas práticas docentes.”.
O trabalho aborda leitura positiva, fracasso escolar e mobilização para o saber e teve como principal objetivo investigar quais relações os estudantes do Ensino Fundamental, com idades entre 11 e 15 anos, estabelecem com os saberes escolares.
A leitura positiva parte da teoria do pesquisador francês Bernard Charlot de que os professores prestem atenção no que os alunos “fazem, conseguem, têm e são”. Charlot acredita que é preciso ver o estudante como sujeito que possui uma história, que interpreta, resiste e busca interferir no mundo no qual vive.
A pesquisa teve como referência metodológica o Grupo Dialogal. Sueli de Lima formou um grupo com 15 estudantes moradores da favela da Mangueira, no Rio de Janeiro, com renda média familiar de um salário-mínimo, com frágeis relações com suas escolas e a sociedade. Eles participaram de cinco encontros durante 14 meses.
A professora fundou e coordena a Casa da Arte de Educar (CAE), uma organização social que atua com educação há 16 anos em favelas cariocas e do restante do Brasil. No trabalho com estes estudantes, ela desenvolveu uma metodologia batizada de “Mandala de Saberes”, cujo objetivo é reconhecer os saberes populares e incluí-los nas práticas pedagógicas.
"Por isso, na pesquisa tentei compreender os estudantes como sujeitos de direito, como parte integrante de um processo e não como pessoas que precisam da escola para tornarem-se alguém", explica a pesquisadora que defende, já na apresentação da sua tese, que condutas educativas marcadas por posturas autoritárias não são pedagógicas.
O material reunido no trabalho foi dividido em três categorias: relações com os professores e a escola; relações consigo mesmo; e relações com os conhecimentos escolares.
"Os resultados apontam para a necessidade de revisões conceituais e práticas, pois os estudantes relataram uma experiência com o saber que só pode ser compreendida se posta ao avesso, uma vez que se tornou evidente que participam de processos de ensino-aprendizagem e não aprendem", explica Sueli de Lima.
Atitudes discriminatórias dentro das escolas também foram apontadas pelos estudantes como obstáculos à aprendizagem. "É comum achar que os alunos são carentes, mas eu me pergunto sempre, carentes de quê? Quando tenho a oportunidade de questioná-los, respondem ‘de cultura' (porque entendem cultura como sinônimo da cultura letrada, escolar), de valores. Nunca escuto que seriam carentes de direitos ou de condições materiais. A escola não pode se tornar um espaço público enquanto for incapaz de superar esses estereótipos que habitam suas práticas”, acredita a pesquisadora.
Durante os encontros, os estudantes afirmaram que para aprenderem precisam de relações coordenadas pelo diálogo e respeito, precisam também participar do cotidiano da escola. O investimento na participação de estudantes na vida escolar é fator que impacta a aprendizagem, conclui a pesquisa que, não por acaso, é dedicada aos estudantes das escolas públicas brasileiras.
SERVIÇO: A íntegra da tese de doutorado de Sueli de Lima Moreira, "O sentido da aprendizagem escolar para jovens de meios populares", está disponível na Biblioteca de Teses e Dissertações da USP: www.teses.usp.br
